sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Instruções para chorar | Julio Cortázar

Instruções para chorar

Prescindindo dos motivos, vamos ater-nos à maneira correcta de chorar, ou seja, um pranto que não ingresse no escândalo, nem insulte o sorriso com paralela e torpe semelhança. Consiste o pranto médio ou corrente numa contracção geral do rosto e num som espasmódico acompanhado de lágrimas e ranho, este último no final, já que o pranto termina no momento em que uma pessoa se assoa energicamente. Para chorar, dirija a imaginação para si mesmo, e se isto lhe for impossível por haver contraído o hábito de acreditar no mundo exterior, pense num pato coberto de formigas ou nesses golfos do estreito de Magalhães onde nunca ninguém entra. Quando o pranto começar, cobrirá com decoro o rosto, usando para tal ambas as mãos com as palmas viradas para dentro. As crianças chorarão com a manga do bibe a tapar a cara, e de preferência a um canto do quarto. Duração média do pranto, três minutos.

Julio Cortázar, Histórias de Cronópios e de Famas; Estampa, 1999

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